terça-feira, 30 de agosto de 2011

Josefina... A Louca.


O sol mal havia apontado a cara lá pras bandas do nascente e já se avista a figura de Josefina, aquela figura diferente, para compreensão da gurizada.
 - Sai pra lá, praga do diabo... Já vinha ela soltando o verbo;
E logo uma pedra voava na direção de um piá daninho, que, pra se divertir e por não ter o que fazer, zoava da pobre figura, dizendo: E aí, “Josefina Loca...”
Mas esbravejando e xingando, ela continuava em frente. E diante do portão de cada casa, batia palmas para pedir alguma coisa para comer. Às vezes, esse pedido vinha precedido de, “abre esse portão, Praga do Diabo, não vê que to cum fome?”
Era costume chegar xingando, pois já vinha acuada pela gurizada da rua, e como as pessoas já a conheciam bem, e entendiam o seu jeito de ser, lhe alcançavam alguma comida, alguma fruta, ou qualquer bugiganga, pois sabiam que era fácil agradá-la.
 - Pega aí, Josefina, mas da próxima vez que chegar gritando e xingando, não te dou nada, entendeu?
 - Adiscurpe, ahahahahah.
E se ia para a próxima casa...
Depois de percorrer toda a vila, voltava com um saco nas costas, cheio de coisas, pois entre comida e bugigangas, além de se manter viva, ela se divertia com o que ganhava, e se ia rumo ao pequeno rancho na beira de uma estrada, fora da vila, onde dormia.
E era sempre assim. Mas algumas vezes passava quieta, resmungando alguma coisa, que só ela sabia o que era; nesse momento não havia provocação que lhe tirasse do sério.
E assim, os píás foram crescendo, e Josefina passando pelas ruas, às vezes gritando, às vezes séria, mas sempre cumprindo a sina de lutar pela sobrevivência.
Quando, em dias de maior lucidez, lhe davam algum pátio para varrer ou capina de horta para executar, isso, sim, ela fazia com presteza. Claro, que nesses momentos, sempre conversando, sabe-se lá com quem, mas fazendo sua tarefa.
Os piás saíram para estudar fora, mas sempre voltavam de férias ou a passeio, para visitar a família, e começaram a notar ou se dar conta que não viam mais a figura da Josefina pelas ruas.
 – Mas que fim deu a Josefina? Por onde anda? Ainda tá viva? perguntavam para a família. Não ouço mais aquela gritaria pela rua...
-Pois é, foi levada pra um asilo, lá na cidade, e de vez em quando é vista por aí, dizem que foge.
 E foi ficando cada vez mais difícil ouvir notícias daquela figura; dizem que foi se acomodando e acabou aceitando a nova casa, que, aliás, era paga por alguns moradores, que cansados de vê-la sofrendo todo dia, pedindo algo para se manter viva, se juntaram para tirá-la da rua.
No entanto, na memória daqueles piás, hoje homens, chefes de família, certamente ficou a imagem dessa figura, como de outras tantas, que vivem por esses fundões do Rio Grande, ou mesmo na cidade grande. Afinal, faz parte do nosso folclore, esse tipo de seres humanos, judiados por alguns, mas que realmente existem e, muitas vezes, viram lendas.
E na inocência dessas pessoas, nota-se, quase sempre, um semblante que parece ser feliz, porque normalmente tem um sorriso espontâneo e sincero.
Por isso cabe a pergunta:
-A Josefina era mesmo louca? Ou, quem era louco nessa história? ...
 Certamente pela idade que já tinha na época, deve ter morrido; mas hoje, na cidadezinha, ela ainda está viva na memória dos mais velhos, que, quando assistem a certas loucuras da juventude, se perguntam: “Será mesmo que a Josefina era Louca?”



Cirineu Pierezan

Imagem: Google

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sexta-feira, 19 de agosto de 2011

1ª Mostra de Arte Sobre Telas Com as Diferentes Faces de Nossa Senhora

O Cento Literário de São Leopoldo, por intermédio da obra – óleo sobre tela  da artista plástica Eclair Moehlecke, representando Nossa Senhora da Conceição, padroeira da Cidade de São Leopoldo,  apoia  a 1ª  Mostra de Arte Sobre Telas com as Diferentes Faces de Nossa Senhora, organizada pela Comissão Arquidiocesana da Comunicação – PASCOM e a Academia Literária do Vale dos Sinos – ALVALES, que está ocorrendo de 15 a 25 de agosto de 2011,  no Aeroporto Internacional Salgado Filho, Porto Alegre – RS.

A Amostra conta com a coordenação geral da professora Iranelci  Padilha e do Pe. Cézar Leandro Padilha – coordenador da PASCOM.    

Estiveram prestigiando o Evento: Jandira T. Weber, presidente do Centro Literário, Mardilê F. Fabre, Gladys Giménez, Jacy  Gonçalves  Ribeiro e Verena Backes.

Nossa Senhora da Conceição, tela doada pela pintora leopoldense Eclair Moehlecke

Iranelci Padilha e Jandira Weber

Jandira Weber e Jacy Ribeiro  com a tela de Eclair Moehlecke

Mardilê F. Fabre junto à tela doada pela pintora Eclair Moehlecke



sábado, 13 de agosto de 2011

Lançamento do livro Caçada na Terra de Sol e Mar

No dia 10 de agosto, o membro do Centro Literário Almir Castilhos da Silva lançou seu romance CAÇADA NA TERRA DE SOL E MAR: Uma aventura de Narayana Surya, Agente de Polícia Federal.


Familiares, colegas, amigos, membros do Centro Literário estiveram presentes ao evento, levando o seu abraço  e confraternizando com o autor no início de sua caminhada no mundo das letras.

Almir Castilhos da Silva

Jandira Weber, presidentee do Centro Literário.

sexta-feira, 5 de agosto de 2011

ÁS DE ESPADAS

Eu entrei na sala, e lá estava ela no sofá, dando as cartas na mesinha de centro. Érica. Tinha uma cruzada de pernas bem alta que combinava perfeitamente com seu microvestido. Um jogo perigoso. Apostas sempre foram o meu fraco. Joguei muita coisa fora apostando, mas também ganhei um bocado, nada muito compensador. Jogava de forma compulsiva até a noite em que encontrei Jesus em um bar, e entre uns copos e outros ele me disse “Filho, as cartas são um atalho para o inferno, comece a apostar em cavalos, é mais sábio.” Desde então eu dei um tempo nas apostas. Não que eu seja religioso, mas é que por aqui não há hipódromos, e eu estava realmente de saco cheio de cartas. Érica tirou um ás de espadas do baralho, jogou-o na minha direção com um sorriso malicioso. Ela veio até mim deslizando lentamente pela sala. A cortina se encorpou com o vento que entrava pelo vidro quebrado da janela. Eu coçava minha barba mal feita e só pensava naquele par de pernas que o vento arrepiou e que chegava cada vez mais perto. Foi o Júlio quem me apresentou Érica. Disse que se eu jogasse pôquer tanto quanto ela, eu poderia trabalhar em um de seus cassinos no Uruguai. Era com esse intuito que ela vinha até a minha casa. Nunca chegamos a jogar pôquer de fato. Ultimamente pulávamos a parte dos cumprimentos e incendiávamos os lençóis. Depois disso, ela fumava um cigarro ainda na cama e tão logo ele apagava, ela colocava sempre o mesmo blues no toca-discos, vestia-se e desaparecia antes mesmo da primeira faixa acabar de tocar. E eu ficava lá, espichado na cama, com os dedos dos pés encolhidos e congelados, contando os nós das madeiras do forro. Não se contabilizam perdas e danos quando você é só, há apenas o que restou. Eu sabia que estava fazendo o jogo errado. Mas se não há risco, apostar torna-se desnecessário. Naquela noite, incendiamos o sofá também. Ela não acendeu o cigarro, pediu para ficar até o amanhecer. Quando o sol começou a aquecer a cortina, ela vestiu-se e disse que não iria mais voltar. Partiria para o Uruguai no final daquele mesmo dia. Disse que se eu quisesse partir com ela e continuar com as aulas de pôquer ela estava disposta a continuar lecionando. Ainda esticado na cama com os dedos dos pés encolhidos e congelados, eu disse que a partir daquele dia eu jamais jogaria cartas. Ela suspirou com o sentimento de que nem mil ases na manga a fariam vencer esse jogo. Érica desapareceu sem colocar um blues no toca-discos, mas deixou seu cigarro acesso no meu cinzeiro. Na noite em que Érica cruzava suas generosas pernas no avião com destino às mesas de apostas, eu caminhava pela calçada vazia com a umidade de início de julho nos meus cabelos. Próximo ao cruzamento me chamou atenção em uma vitrine uma televisão ligada em um programa religioso. Saquei na mesma hora que o apresentador não falava do mesmo Jesus que eu encontrara no bar aquela vez. Os semáforos do cruzamento ficaram verdes, mas não passou nenhum carro. Dei-me conta do quão sozinho estava. Mas aquela não era a primeira e não seria a última noite gélida. Encolhi as mãos nos bolsos e os pés nos sapatos gelados. Segui para casa assobiando uma música qualquer, tentando lembrar qual era o blues que tocava depois que o cigarro apagava.

Fábio Vinicius Monteiro


Imagem: Google

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