domingo, 28 de abril de 2013

Irmão



Irmão é luz que ilumina a minha face
Seja ele pobre ou seja rico eu quero ver
Irmão de todos sem escolha eu quero ser
Para crescer diante do mundo onde se nasce

O meu carinho a todos dou com liberdade
Quero louvar ao Pai Divino e Criador
Que nos gerou com muito afeto e muito amor
Para vivermos numa vida de amizade

Quero aos irmãos sem cerimônia perguntar
Porque se agridem e não podem se amar
Se fomos todos feitos pela mesma Mão

Irmãos são todos que nasceram nesta terra
Quero viver sem o fantasma de uma guerra
Num mundo novo mais fraterno e mais irmão

J. G. Ribeiro

Imagem: Google

quinta-feira, 25 de abril de 2013

Max



Não posso dizer que eu fui um homem forjado por belas vitórias. Na verdade, meus momentos de maior êxito sempre foram quando eu contava os meus maiores fracassos. Na maioria das vezes eram fatos engraçados e geralmente beiravam o surreal. Surreal não no sentido de grandioso, bem longe disso. A última vitória pessoal na minha lembrança tinha ficado tão longe que nem havia mais cabimento citá-la.

Eu tinha me aceitado como perda total não quando me dei conta de que há anos eu estudava para me formar no que eu não queria e trabalhava onde eu não gostava, ou quando vi meu círculo de amizades reduzido ao zelador e ao barbeiro. Foi quando a Natália me abandonou, e não foi bem a falta dela em si, mas o fato de ela ter levado a minha coleção do Surfista Prateado junto.

 Eu havia perdido as últimas referências do prazer de viver. Sexo e quadrinhos.

Naquela tarde todas essas coisas me vieram à mente em um segundo, por isso achei muito irônico e até absurdo quando o estranho me disse:
- Sua alma é importante para nós.

- Pfff. –Dei uma assoprada com um sorriso de canto de boca. – Olha só, não me leva a mal, mas eu não tenho muito o que discutir sobre religião.

- Em absoluto isso é sobre religião. Estamos falando de negócios aqui.

- Bem, ultimamente tem sido difícil distinguir negócios de religião.

- De fato. Mas, quanto mais religioso seu trabalho parecer, menos credibilidade seu negócio tem. Então deixe-me começar de novo, ok? Muito prazer, Jaime, meu nome é Pontes. Sou um “caça-talentos” – disse ele, fazendo aspas imaginárias – e quero oferecer-lhe uma oportunidade.

Pontes era um sujeito que apareceu do nada, aparentava ser de meia-idade, bem apresentável, vestia um terno branco e era de estatura média, cabelos mais para escuros do que para loiros. Eu estava arrependido de estar naquela situação e já estava saindo da mesa com uma desculpa qualquer quando os pastéis e a coca chegaram. A fome puxou-me pelas pernas e eu me sentei novamente.

- Não se acanhe, coma o seu pastel ou eu comerei os dois. – Ele tinha uma facilidade para sorrisos amarelados e convencionais de final de frase.

- Bem, você ia dizendo que é um caçador de almas, não é? Isso não é algo tipo caça-fantasmas?

- Rá. – Deu uma gargalhada seca e sutil como um corte de um serrote. – Você é bem espirituoso, gosto disso, ponto pra você. Esqueça essas apresentações tolas. Responda-me uma coisa, seja sincero, é imperativo que você responda com sinceridade. Pode fazer isso?


- Sim, posso. – Falei enquanto me agarrava a um pastel.
- Pois bem, diga-me o que você faria se eu te desse hoje uma oportunidade de mudar de vida, tornar-se algo que você sempre desejou ser. – Pontes estava com os cotovelos em cima da mesa e as mãos cruzadas na altura do queixo como um terapeuta que acabou de dizer “fale mais de sua droga de vida”.

- Eu faria é nada. Não existem oportunidades que caem do céu. – E tomei um gole de coca, batendo o copo vazio na mesa como se tivesse entornado uma especiaria etílica de beira de estrada.

- Exatamente, meu caro – falou, descruzando as mãos e apoiando apenas o indicador direito em cima da mesa – Essa oportunidade que estou oferecendo não veio do céu.

Eu achei o gesto bem malicioso e fingi gostar da piada. – Ah, tá bom, me deixa adivinhar, você é o Diabo e quer comprar minha alma, é isso? E quer comprá-la com pastéis? Quantos mais vai me oferecer? Manda descer mais e vamos conversar. – Eu ri com um humor tão falso quanto a calabresa do pastel.

Sorriso amarelo. – Olha, é você quem colocou religião no assunto. Eu não iria por aí, mas se esse é o caminho que entende melhor, então vamos lá. Não, eu não sou o Diabo, mas represento alguém que poderíamos dizer que não se encaixa nos padrões “divinos” e que é equivocadamente visto por alguns atos mal interpretados como “O Diabo”. E sim, ele está interessado nos seus talentos.

- Olha, Pontes, já que tu pediu sinceridade, eu vou ser sincero. Estou aqui só pelo pastel e a Coca. Assim que eu terminar eu vou me levantar e vou embora, e sem vender nada pra ninguém porque eu não acredito em Deus ou no Diabo, então até lá pode falar o que quiser.

- Rapaz, não acreditar não é problema porque nós acreditamos em você e isso faz toda a diferença. Diga um sim para você mesmo e então me deixe proporcionar a você algo para fazer a sua vida valer a pena.

- Oh, Pontes, eu sei que tu vai pagar esse lanche e agradeço, mas isso não lhe dá o direito de falar da minha vida. Do jeito que está falando tá parecendo que a minha vida é uma merda.

- Jaime, eu não ofereceria essa oportunidade para qualquer um, a nossa seleção não é aleatória. Nós conhecemos você muito bem.

- Espera aí, tem me espionado?

- Não. Nós temos observado, e bem de perto.

- Ah, ok, então fale um pouco sobre a minha interessante vida.

- Agora mesmo. – Ele colocou sobre a mesa uma maleta de couro marrom que parecia ter vindo direto dos anos 30 e tirou dela um calhamaço de papel, botou o dedo em uma linha qualquer e começou a dizer: – Blábláblá, Jaime, filho único de pais já falecidos, desenhista na adolescência, não desenha mais, músico aos 18 anos, nunca teve uma banda, não tem contato com familiares, vive sozinho desde que sua namorada fugiu com seu colega de serviço. Isso é embaraçoso, Jaime, eu posso continuar, e você sabe que isso só piora.

- Escuta, foi a Natália quem te mandou? Só pode ser, diga a ela que quero as minhas revistas de volta.


- Eu conheço a Natália muito bem também, afinal, quando nós o conhecemos ela estava com você, mas ela não está envolvida nisso. O fato é que, se chegarmos a um acordo aqui, você mesmo terá colhões para ir buscar as revistas e talvez até mesmo dar um último trato nela e até conversar mais de perto com esse seu colega que a roubou e de quem você senta bem à frente no trabalho. Aliás, trabalho é algo com que você não precisará mais se preocupar.

- Espera aí, eu vou ganhar dinheiro nesse treco?

- Acho que agora eu consegui chamar a sua atenção. Vamos encurtar, ouça a minha proposta sem compromisso, se achar que não dá, eu pago o seu lanche e você pode ir para o seu trabalhinho com seu coleguinha. Ok?

- Pode ser. Já que eu não vou pagar a conta mesmo.

- Pois bem, eu represento alguém que financia sonhos. Investe em sonhadores. Ele realiza desejos. Entretanto, ele não é um ser caridoso. Como eu disse, isso são negócios, e negócios são sempre duas partes beneficiadas. Talvez, em alguns casos, uma parte mais beneficiada que a outra; afinal, nem sempre se faz um bom negócio. Mas não é esse o mérito da questão. De um modo bem grosseiro, é como uma casa de penhores. O cliente penhora o seu bem e o investidor a quem represento banca o seu sonho, é uma troca, negócios estão baseados em troca entre duas partes.

- Ah, tá, por que não falou antes? Isso é hipoteca, agiotagem e coisa assim.

- De fato. Pode ver dessa forma também, você é bem objetivo, gosto disso. E, sendo objetivo também, nossa moeda de troca não é dinheiro ou bens materiais. É como você disse, é alma.

- Então você está aqui para comprar a minha alma de fato?

- Exato. E, fechando negócio, quando sair por aquela porta será aquilo que sempre quis ser.

- Humm. Interessante, então vou sair daqui um astro de rock milionário?

- Bem, não exatamente. Primeiro, quando te disseram que você não tinha talento pra tocar, de fato não era uma mentira. E segundo, se eu te tornasse milionário hoje com toda a sua aptidão para administração, você estaria pobre antes do final de semana. Tenho que deixar claro, milagres é com a concorrência. E não quero ser antiético, mas, caso a concorrência te atenda (o que é raríssimo), o pós-vendas deles é horrível.

- Então vou ser um arqueólogo aventureiro? Eu sempre quis isso também – não havia outro caminho senão o deboche.

- Jaime, ainda não terminei a proposta. Ouça. A abordagem que estou fazendo não é para um futuro cliente, e sim para um futuro colaborador. Uma mera questão de perfil, você pode ser colaborador e não um cliente.

- Então eu ainda continuo um empregado, que ótimo negócio. Pensei ter ouvido tu dizer que eu seria o que eu sempre quis ser.

- Sim, e será. Deixe-me falar sobre a sua função. Nosso “empregador” faz o primeiro investimento, depois o nosso cliente entra com a contrapartida. Ora, algumas vezes nos enganamos com o caráter de alguns clientes que não querem cumprir a sua parte na negociação. Mas isso é mais normal do que você imagina, entretanto é normal também efetuarmos a cobrança. E é aí que você entra.

- Ah, sim. Então serei o cobrador do inferno batendo de porta em porta dizendo “Olá, vim buscar sua alma”?

- Não. Há procedimentos para isso, escute. SALÁRIO – aumentando o tom de voz – não temos um fixo. Entretanto, você sempre terá no bolso a quantia de que precisar. Mesmo que esteja sem nada na carteira, sempre que colocar a mão no bolso, a quantia estará lá, exata. É algo que vem a calhar, pois o seu carro bebe muito.

- Mas eu não tenho carro.

- Pois agora tem. Benefícios. Enquanto trabalhar conosco, não terá problemas de saúde. A menos que você comece a fumar: nossos clientes fumam, colaboradores não. Fique longe dos cigarros e viverá muito mais do que seus avós. Ah, já ia esquecendo, esse nosso plano de saúde não tem carência, o que é raro hoje em dia.

- Tá tudo muito bonito, mas me diz quando vai chegar a parte de ser “tudo o que eu desejava ser”?

- Acalme-se, ainda não falei todos os benefícios. Você atuará à margem da lei. Se por acaso for preso, será solto no mesmo dia; se alguém prestar queixa, nunca será intimado. Temos influências nos mais altos escalões.

- Isso quer dizer que vocês têm bons advogados, então? Sempre imaginei que advogados fossem a representação do Diabo na terra, agora eu tenho certeza.
- Ah, sim, departamento de marketing falho. Não está sendo fácil reverter essa publicidade negativa. Mas, enfim, vamos ao que te interessa. O que vamos lhe proporcionar é algo que vem a calhar com a nossa necessidade. Precisamos de um cobrador e é isso o que você será.

- Continuo discordando.

- Ahhh. Pare e pense: você nunca pensou em ser um cara mal-encarado que anda em um V8 preto, escondendo uma Remington 870 cano serrado debaixo da jaqueta de couro e que mete o pé na porta de quem lhe cruza o caminho?


- Não. Nunca.

- Como não? Você desejou isso, sim. Já faz um tempo que não pensa nisso, mas está aqui, no nosso relatório. Não há erro: você quer isso, sim.
- Você é maluco, qualquer um que viu a Sessão da Tarde pensou isso. Eu tinha o quê? Nove? Dez anos?

- Não seja modesto, Jaime, somente as crianças têm os desejos mais verdadeiros. Quando você cresce, tudo o que você possa querer é fruto de tendências, e isso não é nada sincero. Quando você desejou, estávamos lá e desde então o observamos.

- Você é maluco. Vai me dar um contrato para assinar com sangue também?
- Isso é folclórico e anti-higiênico. Olhe ali do outro lado da rua – disse, apontando pela janela. – Ali, aquele Maverick V8 preto fosco. É seu. Pode ir lá conferir, sem compromisso. No porta-luvas tem a lista de nomes dos devedores. Na verdade não é bem uma cobrança, você faz parte do ultimo estágio, vai executar a dívida, é fácil e vai entender quando abrir o porta-luvas, tá tudo lá dentro. O que me diz?

- O que é executar a dívida?

- Ora, Jaime, quando você não paga a hipoteca da casa, o que o banco te toma? Nosso negócio são almas, então é só somar dois mais dois. Parece algo chato de fazer, mas depois de começar você vai adorar. Vá até lá, o carro está aberto, abra o porta-luvas e pense. Se quiser encarar, vire a chave e então nosso contrato estará assinado. E esta é a minha proposta, espero que venha trabalhar conosco. Agora, se me der licença, eu preciso ir, tenho mais duas entrevistas para fazer.

- Isso tudo é uma maluquice.

- Talvez seja, Jaime, talvez seja, mas de que vale uma vida inteira sem sequer um momento de loucura? Ah, a propósito, te aconselho a mudar o seu nome. Nada pessoal, mas seu nome não condiz com a função. Caso queira mudar o nome, mude antes de virar a chave, senão será uma burocracia dos infernos. Agora seja gentil e pague a conta.

- Ei, falei que não tenho grana.

- Homem de pouca fé. – Pontes fechou a mala, saiu por entre as mesas e bateu porta atrás de si. Desde então, nunca mais o vi.

Na saída do bar o atendente gritou – R$ 8,50 e foi exatamente isso que eu tirei do bolso. Atravessei a rua e receosamente entrei no V8. No porta-luvas havia uma lista com muitos nomes e endereços. Também ela estava ali, linda, de cano duplo e serrado com muitos e muitos cartuchos. Eu estava tomado por uma sensação que nunca havia sentido, sentia-me elétrico, como se todas as minhas terminações nervosas estivessem a todo vapor. Sentia-me seguro. Peguei-me procurando o nome da Natália na lista. Não sei explicar o que senti ao não encontrá-la ali. Minha vida sempre foi um barco à deriva, o máximo que poderia acontecer seria afundar. Virei a chave em um único movimento, sem pensar. Nada aconteceu além de o motor começar a trabalhar. Soltei o freio de mão, engatei a primeira e logo uma segunda, dobrei na próxima esquina, logo veio a terceira e a quarta marcha. Acomodei-me melhor no banco e finalmente não me sentia oprimido depois de muitos anos, sem definir um trajeto apenas deixei-me relaxar com a música que vinha do motor enquanto o carro deslizava na avenida principal naquele fatídico entardecer.

Fábio Monteiro

Imagem: Google

quarta-feira, 17 de abril de 2013

Profecia

 


Indiferente a dolorosa guerra mata
Não escolhendo qual das vidas vai ceifar
Seja criança ou adulto a guerra ingrata
Faz do inocente uma bandeira pra matar

Deus tudo vê e vem um dia corrigir
Toda maldade que o homem praticou
A Sua obra quer conosco concluir
E um mundo novo pra seus filhos projetou

Nossa Senhora veio e trouxe a profecia
Que chegará em meio a uma noite fria
E tudo escuro por três dias vai ficar

Um gigantesco terremoto está pra vir
Para que as guerras possam então poder sair
E o fim do mundo ninguém vai poder parar

J. G. Ribeiro
Imagem: Google

sábado, 13 de abril de 2013

Guri arteiro



Na mais pura liberdade
Corria muito contente
Pensando que era gente
Guri de bem pouca idade
Lembrando até dá saudade
Andava por toda parte
Fazendo um pouco de arte
Mas não fazia maldade

Correndo sem ter cuidado
Por mato, campo e lavoura
No meu pingo de vassoura
Tinha a mãe recomendado:
“Tu não pula o aramado
Pois, tem um touro de raça”!
Talvez, por pura pirraça
Eu passei pro outro lado

Com o meu pequeno laço
Reboleando em pleno vento
Laçar o touro eu tento
Porém, sentindo cagaço
“E agora, meu Deus, que faço!”
Estava feita a besteira
Subi num pé de aroeira
Fiquei num baita embaraço

O touro escarvava no chão
Era brabo o bicho macho
Eu só olhava pra baixo
Na difícil situação
Aroeira dá comichão
Comecei sentir coceira
Meu pai, longe, na mangueira
No seu ofício de peão

Fui ficando apavorado
Por não passar um vivente
Fui guri desobediente
Quando passei o cercado
Já de fundilho molhado
Então lembrei de rezar
Para o sufoco passar
Prometi ser comportado

Couro e pele toda ardida
Já passando meio-dia
Eu de barriga vazia
Gritava: “mamãe querida”!
Parecendo causa perdida
Todo cheio de ai-ai-ais
Surgiram então os meus pais
Que me orientaram na vida.

W. F. Aquino

Imagem: Google

quarta-feira, 3 de abril de 2013

Atração

















Aí vem o sol desvirginando a madrugada
Vem derramando a sua luz e o seu calor
Sobre esta terra sua eterna namorada
Aprisionada pelo elipse do amor

Não cansa o sol de sua amada cortejar
Marcando as horas com fiel soberania
Não cansa a terra de um convite aguardar
Pra ser a dama do universo nos seus dias

Vivem no sonho de um dia se encontrarem
Contando o tempo para nele se casarem
Enquanto bailam pelo espaço sideral

Durante a noite vejo estrelas se chegando
Cercando a lua elas vão lhe acompanhando
Até que venha novamente o sol reinar

J. G. Ribeiro

Imagem: Google