domingo, 7 de janeiro de 2018

Nossa rotina e o Homem das Cavernas




No princípio, quando na Terra a Natureza era pujante, o homem das cavernas não muito alto, mas robusto, era essencialmente carnívoro e dedicava-se com afinco às caçadas de animais na maioria das vezes ferozes. Divertia-se, trabalhando. Embrenhava-se na mata, na época fechada, espinhenta e varava as noites na espreita da fera, geralmente mais forte que ele próprio. Lanhava-se todo, sofria cortes, mordidas e arranhões, mas dominava a presa e, ao cair da tarde, de volta para sua caverna, era recebido carinhosamente por suas amadas. Sim, amadas, pois eram tempos de poligamia. Carneava a caça com presteza, comia a sua parte e após banhar-se nas águas límpidas e frescas de uma fonte cristalina, mergulhava em sono profundo sob o olhar atento de seu harém. E esta era a sua rotina.

Na caverna, não havia mobília e dormia ao rés do chão. As paredes eram lisas e úmidas e os restos de comida ficavam dependurados nas árvores, em lugar seguro, para evitar que um corvo faminto viesse saciar sua fome. Aos vinte e oito anos, entediado, corpo coberto de cicatrizes, transferia seu único patrimônio, as concubinas, para outro guerreiro e procurava uma pedra, no alto de uma coxilha, à sombra de um ingazeiro e esperava a morte chegar. Não a temia, pelo contrário, festejava o seu ocaso, pela certeza do dever cumprido.

Mesmo que na narrativa acima eu tenha fantasiado a história, a rotina desta figura pré-histórica e de hábitos rudimentares representa para muitos, ainda hoje, o modelo de convivência ideal, o homem em harmonia com a Natureza. Entretanto, o homem moderno, em nada lembra o seu ancestral. Ainda que, a própria Natureza conserve seus encantos, o habitat do guerreiro se tornou agressivo, inseguro.

Na esteira do desenvolvimento vieram as inovações tecnológicas. Na Terra de hoje, impera o cinza e o que era lúdico se transformou em uma dura realidade. Para fugirmos do inferno da BR 116, viajamos em pé num trem lotado, não climatizado e barulhento. Para quem tem trabalho, esta é uma rotina. Para quem está desempregado, a rotina é outra: olho nos classificados, bater pernas pela cidade ou amanhecer na porta do CINE, na esperança de ser contratado e já sabendo que terá que pelear até a terceira idade. Elevador pifado, esquecer a senha do banco, apagão elétrico e greve nos serviços essenciais, são apenas atrapalhações da vida.Mães descartando recém nascidos, motoristas bêbados atropelando pedestres, já são consequências da neurose coletiva.Na volta ao lar, ouço que devido ao calorão ventou forte, caiu o sinal da televisão, a Internet está fora do ar.

 Caramba, como era feliz o homem das cavernas!



Anildo Martins da Silva
Imagem: clickpb.com.br 

Nenhum comentário:

Postar um comentário